A literatura comprometida
Por Bernardo Buarque de Hollanda
A leitura do livro Sartre – vida e obra, de autoria do psicanalista Luiz Carlos Maciel, publicado pela editora Paz e Terra em meados dos anos 1980, enseja questões centrais que o filósofo francês coloca à literatura: o que é escrever? Por que se escreve? E, tão importante quanto: para quem se escreve? A tentativa de responder a essas perguntas leva Jean-Paul Sartre a se interrogar sobre o sentido que a literatura deve possuir para o escritor e para a sociedade a que pertence.
A separação dos gêneros literários em prosa e poesia permite a afirmação de que o primeiro deles desempenha um papel notadamente social, ao passo que o segundo tende a uma função artística. Por que essa distinção? Sartre dizia que a prosa se utilizava basicamente de significações, divergindo dos poetas que, assim como os pintores e compositores, lidavam com coisas, pois as palavras eram propriamente um signo.
Nesse sentido, o escritor de prosa tem um compromisso com o que escreve e com seu destinatário, isto é, com quem vai lê-lo. A forma como será abordada a realidade é decisiva, na medida em que o leitor é por ele influenciado nos seus pensamentos e na sua maneira de conceber e agir no mundo.
Esses são em linhas gerais os alicerces da concepção sartriana acerca da literatura. Com base em tais premissas, o filósofo francês propõe o estabelecimento inovador de uma ética para quem escreve, em especial para a prosa. Deve-se observar que a necessidade de se criar uma moral para a intelectualidade adveio do contexto social em que o autor se inseria. O filósofo existencial vivia na Europa do pós-Segunda Guerra, onde os nazifascistas haviam cometido atrocidades sobre milhares de seres humanos, com os pressupostos ideológicos estribados na supremacia e no racismo.
A obra sartriana, portanto, precisa ser compreendida como uma insurgência contra esses fenômenos aberrantes de que foi testemunha histórica. Em face disso, havia a obrigação da atuação compromissada do escritor para com os destinos da vida coletiva. Afora tais circunstâncias, pode-se pensar se nos dias de hoje, ou independente das circunstâncias, trata-se de um dever moral do homem de pensamento tal ordem de compromisso.
Pode-se aventar a possibilidade de que na atualidade não há cabimento para tal postura. Ou por outra, entende-se que o gênero da prosa não pode ser regido exclusivamente por tal princípio. A estética anda de par com os textos de ficção. O que é relevante é a liberdade de o escritor se comunicar, de criar empatia para com o outro, seja em seus sentimentos ou pensamentos diante da vida e do homem.
E assim sendo, a teoria sartriana do comprometimento também pode ampliar-se até as manifestações denominadas artísticas, à maneira da poesia, da pintura e da música.
Edição Final: Guilherme Mazzeo
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