Quer algo pós-moderno? Latte Art!
Por Enrique Shiguematu
No desespero de sair da situação de desempregado. Cogitei oportunidades de virar barista, um profissional especializado em bebidas baseadas em café. Curiosamente as vagas de barista, diferente de quase todo o resto do mercado trabalho, não exigem inglês, nem excel, nem "cabeça de dono", nada disso. Nem precisava comprovar experiência! Para virar barista, bem, a única coisa que precisava era curso de barista. Eu não tenho curso de barista. É. Grande novidade.
Mas não me desanimei. Assim como aprendi fotografia com os infinitos tutoriais do Youtube, poderia aprender a arte do barista, certo?
Nunca estive mais enganado.
Sim, você encontra bons vídeos que lhe mostram os passos corretos de como fazer um espresso, como esquentar o leite no vapor, qual é a diferença de um capuccino para um latte… Um mundo à parte. A atenção perfeccionista para os pequenos detalhes e procedimentos e opiniões de paladar que ficam próximos à pedância dos sommeliers definitivamente me indicaram para não mergulhar de cabeça no mundo café, por mais "romântico" que seja trabalhar numa cafeteria. Mesmo eu, um cara dos detalhes, fico pasmo com o nível de precisão que a arte do barista demanda. Se você acredita que consegue ser extremamente preciso, tanto mentalmente quanto mecanicamente, vire barista. O mundo precisa de mais pessoas atentas ao seu café.
Por que digo isso? Já viu Latte Art? É uma técnica super-difícil na qual o barista "desenha" todo tipo de forma com leite no seu café. Quando digo super-difícil, eu quero dizer realmente difícil, como encostar a sua testa na ponta do seu pé. Bem, talvez eu esteja exagerando, mas não achei nada na internet que me indicasse que é algo trivial.
Latte arte chega a ser uma experiência que vale mais que o café em si. Um pingado de padaria não vale, nem de longe, o mesmo que uma xícara bem executada de latte art. Se você fotografa um pingado e joga no instagram, provavelmente vai colocar de legenda #segundafeira #sono. Mas se você lançar nas redes sociais uma xícara com latte art, vai escrever uma mensagem que pode ser traduzida em #souchique #sourico #nãotomocafédeplebeu.
A experiência de saber que seu café foi feito com todo o ritual da máquina de espresso aumenta o preço. O consumidor aprecia a noção de que um sujeito treinou anos e anos para fazer aquela xícara de "café com leite" vale mais que a bebida em si. A atenção que devia estar voltada ao sabor da bebida se redireciona para sua estética. A sobrevalorização das experiências é um elemento claro da pós-modernindade. Latte Art é um excelente exemplo de como, num mundo onde parcelas da população usufruem de abundância e excedentes relativos, as atenções e demandas estão sendo redirecionadas para coisas cada vez mais exóticas e gourmetizadas.
Então não se esqueça, se o "cafézinho" ou o "café com leite"está custando quase 10 reais naquela padaria um pouco mais sofisticada, lembre-se que é culpa da pós-modernidade!
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