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GV CULT - Criatividade e Cultura

Sobre sonhos, liberdade e felicidade

Ana Vidal

29/02/2016 19h57

Por     Marcio Samia 

Fotos por Marcio Samia

Fotos por Marcio Samia

Passando pela cidade de Santiago de Compostela, segui meu Caminho pela famosa rota que leva os peregrinos até o "Fim do Mundo". Seriam mais 120 quilômetros, mas em Finisterra eu conseguiria avistar o "maior pôr do sol do mundo". Pelo menos é o que tinha ouvido falar.

De fato, essa imagem será para sempre lembrada por mim. Os antigos espanhóis acreditavam que o mar engolia o sol todos os dias, e por isso temiam o oceano. Daí a origem de muitas lendas dos mares. Daí também a origem do nome da cidade – Finisterra – que para eles era o "final da terra". Dali pra frente, só oceano e, talvez, um abismo sem fim.

O trajeto até lá também é fantástico. Repleto de paisagens de tirar o fôlego e reflexões inevitáveis. Já fazia quase 30 dias que estava caminhando e parecia que não queria mais parar.

Apesar dessa beleza toda, uma estátua em particular me chamou a atenção. Era um homem que tinha raízes nos pés, tentando sair de casa, e uma criança o segurando, desesperadamente pelas calças, impedindo-o de partir (foto).

Ao chegar no albergue onde passaria a noite, fui jantar. Na espera, notei uma gaiola aberta na varanda da casa. Curioso que sou, perguntei ao dono do albergue o porquê daquele objeto. A resposta, óbvia, me surpreendeu:

– Assim coloco alimento e água e cada dia tenho pássaros diferentes para cantar pra mim. A gaiola é só pra enfeitar.

Interessante ver aquela gaiola aberta, e saber que a cada dia pássaros voltavam ali para desfrutar daquele benefício cômodo, e oferecer um pouco do seu canto ao proprietário.

Ao terminar minha refeição – deliciosa por sinal – olhei mais uma vez a gaiola e fui deitar. Acho que após 30 dias de caminhada, refletir e traçar um comparativo entre a "falsa" sensação de liberdade daquela gaiola aberta e a minha condição era inevitável.

Você que está lendo esse texto, já pensou em quantas situações escolhe estar diariamente, seja no trabalho, na vida amorosa, pessoal ou em qualquer outra situação, simplesmente por não querer arriscar voar mais alto encarando, assim, uma verdadeira mudança?

A vantagem da "gaiola"

A verdade é que é muito confortável a gente se lamentar e reclamar dentro da gaiola. Ali você encontra outros na mesma situação, e enquanto esbraveja pra todos que "lá fora" é melhor, você tem a sensação de que é superior por ter, pelo menos, a consciência disso. Só que você continua lá. Preso. A gaiola está aberta pra você ir, mas você volta todo dia para aquela situação que, você jura por Deus, um dia vai largar.

E sabe porque você continua indo pra lá?

Porque apesar de não ser o que você sonhou, você desfruta de todos os benefícios que aquela situação te proporciona. E planejar uma mudança pode dar muito trabalho.

Ali, no Fim do Mundo, olhando pra uma gaiola aberta, comecei a perceber alguns pontos que estavam aprisionando meus sonhos. E foi ali que percebi que resolvi caminhar porque o desconforto havia se tornado maior que o benefício.

O peso da responsabilidade

Precisava pensar. Caminhar seria ótimo pra isso. 800 quilômetros me pareciam de suficiente tamanho. Só que quanto mais me sentia "livre", mais opções eu tinha. E escolher uma delas pra seguir era uma responsabilidade sem igual.

E se não der certo? O que vão pensar de mim? Quem vou responsabilizar se fracassar?

Essas eram algumas das perguntas que insistiam em martelar minha mente. Era fácil, agora, entender que enquanto eu estiver nessa "gaiola" será muito fácil justificar minhas frustrações responsabilizando quem "me prendeu" lá. Assim eu terceirizo essa culpa, e ainda saio da situação como se fosse quase um mártir do sistema.

Caminhando por mais de 30 dias num caminho mágico, entendi que agora a responsabilidade das minhas escolhas era somente minha, e de mais ninguém. E isso era tão gratificante quanto aterrorizador.

Sair do lugar comum, enfrentar chuva, vento e até granizo, pisar na lama e no gelo, descobrir novas culturas e histórias… tirar esse pequeno período sabático me fez abrir mão de toda a "segurança" que eu tinha.

E quer saber? Foi sensacional. Me senti vivo e feliz!

Compreendi que pra qualquer sonho basta que nos preparemos. Foi assim que andei mais de 800 quilômetros. Com planejamento, foco e ação.

Como estão suas asas? Aprisionadas numa "gaiola" ou prontas para voar?

                Grande abraço. Nos veremos com certeza nos céus, Evoluindo por aí!

Edição          Ana Vidal 

Marcio Samia

 

Sobre o editor

Guilherme Mazzeo é coordenador institucional do GvCult, graduando em Administração Pública pela FGV-EAESP. Um paulista criado em Salvador, um ser humano que acredita na cultura e na arte como a direção e o sentido para tudo e para todos. A arte é a mais bela expressão de um ser humano, é a natureza viva das coisas, a melhor tradução de tudo. Só a cultura soluciona de maneira sabia e inteligente tudo, a cultura é a chave para um mundo melhor, mais justo, livre e próspero! Devemos enaltecer e viver nossas culturas de forma que sejamos protagonistas, numa sociedade invasiva e carente de: vida, justiça, alegria e força.

Sobre o Blog

O GV Cult – Núcleo de Criatividade e Cultura da FGV desenvolve atividades de criação, fruição, gerenciamento, produção e execução de projetos culturais e de exercícios em criatividade.