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GV CULT - Criatividade e Cultura

Os intérpretes do Brasil na Festa Literária das Periferias

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06/05/2014 09h01

Por Bernardo Buarque de Hollanda. 

"Maravilhas de milhares de brilhos vidrilhos,

Calma do noturno de Belo Horizonte

O silêncio fresco se desfolha das árvores

E orvalha o jardim só."

Mário de Andrade

No último dia 26 de abril, tive a oportunidade de participar em Curitiba da primeira edição nacional da Festa Literária das Periferias, a FLUPP – Brasil. Depois de dois anos consecutivos no Rio de Janeiro, o encontro se expande e em 2014 será realizado em quatro capitais. Além do Rio e de Curitiba, Salvador e São Paulo também receberão o evento.

FLUPP

A iniciativa foi concebida pelos produtores culturais Júlio Ludemir e Ecio Salles, com o propósito de produzir curtos-circuitos culturais e de ampliar as potencialidades do acesso público ao círculo literário nacional e internacional, como se sabe, tradicionalmente elitista e restrito a ínfimos enclaves urbanos.

Na esteira do sucesso da Flip de Paraty, matriz da fórmula que se espalhou e multiplicou pelo país, a Flupp te sido muito bem sucedida. Em 2012, Ferreira Gullar, Ariano Suassuna e Ana Maria Machado estiveram presentes. Já em 2013, o acadêmico Marco Lucchesi compareceu ao encontro no Morro dos Macacos, enquanto o poeta Antônio Cícero participou do evento em Vigário Geral. Vila Cruzeiro e Borel foram outros pontos de destino da Festa.

Na capital paranaense, o local escolhido foi uma escola municipal da CIC, a Cidade Industrial de Curitiba. A abertura ficou por conta do romancista Cristóvão Tezza, autor de premiadas obras que de vão O filho eterno (2007) ao mais recente O professor (2014), mas cuja produção ficcional remonta ao final da década de 1970.

CT

Uma outra novidade dessa edição foi a introdução de um conjunto de palestras dedicadas a intelectuais que pensaram o país e que legaram obras hoje consideradas clássicas do pensamento social brasileiro.

Os escritores selecionados foram Mário de Andrade, Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Darcy Ribeiro, autores respectivamente de: Macunaíma (1928); Casa-Grande & senzala (1933); Raízes do Brasil (1936); e O povo brasileiro – a formação e o sentido do Brasil (1995).

Coube ao filósofo Eduardo Jardim falar de Mário de Andrade; já o historiador e antropólogo Marcos Alvito tratou de Gilberto Freyre; eu me detive em Sérgio Buarque de Holanda; e Yolanda Linda Lobo apresentou Darcy Ribeiro.

Se tais obras são na atualidade parte básica indispensável da formação universitária de alunos dos cursos de Letras, História e Ciências Sociais, tratar delas em espaços diversos aos da Academia é dos desafios mais instigantes para aqueles professores-palestrantes responsáveis por apresentar os ensaístas também reconhecidos como intérpretes do Brasil.

Um aspecto em comum a esses quatro autores, e que vai ao encontro do espírito da FLUPP, é o fato de todos se posicionarem contra uma visão bacharelesca e excludente da literatura, compartilhada, ainda hoje, por muitos intelectuais. Segundo os autores, cultura e educação devem andar de mãos dadas caso queiramos ampliar o nível de desenvolvimento social e democrático de uma sociedade.

Dos quatro, destaque para o pragmatismo de Mário de Andrade, em virtude de suas ações culturais no Departamento de Cultura da cidade de São Paulo, durante os anos 1930, quando concebeu e implantou as bibliotecas itinerantes, que facilitavam o acesso da população a esse raro objeto, o livro.

Merece ser destacado também o discípulo de Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro, responsável por uma antropologia "em mangas de camisa", ao criar não só universidades como a UnB e a UENF, como igualmente por conceber na década de 1980 o Centro Integrado de Educação Pública, o CIEP, dotado de bibliotecas e equipado com condições ideais para a integração da comunidade com o espaço da escola, em sua acepção mais ampla de lazer, cidadania e cultura.

Eram assim não apenas "pensadores", mas igualmente "agentes" das transformações de que o Brasil precisava – e de que ainda precisa!

Edição: Samy Dana e Octavio Augusto de Barros.

Sobre o editor

Guilherme Mazzeo é coordenador institucional do GvCult, graduando em Administração Pública pela FGV-EAESP. Um paulista criado em Salvador, um ser humano que acredita na cultura e na arte como a direção e o sentido para tudo e para todos. A arte é a mais bela expressão de um ser humano, é a natureza viva das coisas, a melhor tradução de tudo. Só a cultura soluciona de maneira sabia e inteligente tudo, a cultura é a chave para um mundo melhor, mais justo, livre e próspero! Devemos enaltecer e viver nossas culturas de forma que sejamos protagonistas, numa sociedade invasiva e carente de: vida, justiça, alegria e força.

Sobre o Blog

O GV Cult – Núcleo de Criatividade e Cultura da FGV desenvolve atividades de criação, fruição, gerenciamento, produção e execução de projetos culturais e de exercícios em criatividade.