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GV CULT - Criatividade e Cultura

Incertezas vivas

GvCult - Uol

25/02/2021 06h11

Vânia Mignone

Por Vítor Steinberg

Leitores, um pedido. Por mais ímpar que isso pareça: não se submeta à lacração de rede social. Não aceite esta sociedade. "Se quer voar, desista do que te pesa" (Toni Morrison). É a bazófia social que é obrigada a se elevar e compreender arte, cultura, cinema, balé. Não se iluda a crer no contrário. Não deixe a porcaria te inundar no lamaçal da lacração.

Se tudo tiver que ser adaptado à ignorância, tudo será destruído, como o Museu Nacional, e você não saberá mais o que fazer. Vai sentir vergonha alheia de ir ao Theatro Municipal. Por que é neoclássico e tem a letra H. Por que é "europeizado". Fuja disso!

Charlie Hebdo: "Fodam-se! Nós temos Champagne!"

A arte não é antagonista. Não antagonize os artistas, antagonize celebridades. E os wannabes. A meritocracia. Gestão de whatsapp. Curso de "consultoria da vida" da Gretchen. Não antagonize todo mundo se você não tem armas suficientes para enfrentar o mundo. Que mundo?

A ignorância é o senso-comum. A vera infecção, o mal. O pior caminho, o mais fácil, o mais sedutor – e não dá em nada.

Internauta, comentarista de plataforma, por que não veste uma toga se deseja tanto o judiciário? Mediador da realidade: sei bem o que é verdadeiro, vou me proteger em minha armadura de ferro em brasa chamada smartphone ou laptop e reconquistar a Judeia numa cruzada alucicrazy.

Aproveita e põe a peruquinha branca, transforme-se no grande juíz, caricato e inexorável, com seu martelão marretando qualquer coisa que você acha censurável. A perigosa moda na Espanha é rapper anti-monarquia e influencer nazi de dezoito anos, bancando glamour fascista, discurso de ódio e skinhead pitbull tocando guitarra elétrica.

Se a maioria é ignorante, a minoria sábia é inimiga, arrogante, burguesa. Se a democracia fica nas mãos do acaso, não há possibilidade do filósofo ser governado pelo que não sabe. Impeça a fofura, a preguiça. Afunde nos livros, vá até as profundezas mais recônditas de cinco mil anos de oceanos de sabedoria. Nem que seja por vídeo do YouTube. Se for escolher uma sociedade, que seja a literária dos séculos XVII e XVIII cujos membros adotavam nomes poéticos, a Arcádia.

Na Arcádia, o país imaginário dos poetas, espécie de Pasárgada globalizada, reina a felicidade, a simplicidade e a paz num ambiente idílico habitado por uma população de artistas que vivem em comunhão com a natureza.

O que conhecemos hoje por sociedade, nada fustiga, está na função soneca. Em que momento a vida deixou de ter valor? Seja na guerra, na medicina, na ciência ou no terrorismo. O oposto de coletividade é ressentimento.

Na Grécia, ressentimento era chamado de cólera, ou ira, aquele que nunca pode ser um amigo. Que não pode fazer parte da fraternidade, da civilidade. Nessa violência pura, não há relações políticas. Com esse abandono estranho e preocupante, os lacradores, negacionistas e internautas de plantão, relativistas, tudo em dúvida, tudo em xeque, vivem testando a pedra filosofal: devo conhecer isso? Isso serve à vida ou não? São os mais cooptantes ao servil. Não são libertados de nada, muito menos desconstruidões, são a favor de que tudo serve, é serviço de alguma coisa.

Marketing existencial, sem oxigênio para outros valores. Tudo tem o preço do servil. A arte nunca está a serviço de nada. Quem é o show runner responsável por essa zona? Primeiro vem o medo, depois o desejo de vingança.

Aqui neste planeta plano (os terraplanistas estão no poder), o elã amorteceu, entristeço no fundão da minha alma, quase encontrando petróleo, ouvindo Roberta Martinelli choramingando no Som a Pino. Semelha que nem levantou da cama, está com cólica, lamentando tudo, num luto sem fim. Na Rádio Cultura FM também, os jornalistas em pânico, senis, sofrendo qualquer rachadura estremecedora das bases. Desligo tudo, faço um brigadeiro, passeio com o Tupã, fumo um baseado gigante e coloco um blu-ray do balé Bolshoi. Lembre-se da frase de Sartre:

"Se na solidão você está só, então está em má companhia".

Edição Final: Guilherme Mazzeo

 

Sobre o editor

Guilherme Mazzeo é coordenador institucional do GvCult, graduando em Administração Pública pela FGV-EAESP. Um paulista criado em Salvador, um ser humano que acredita na cultura e na arte como a direção e o sentido para tudo e para todos. A arte é a mais bela expressão de um ser humano, é a natureza viva das coisas, a melhor tradução de tudo. Só a cultura soluciona de maneira sabia e inteligente tudo, a cultura é a chave para um mundo melhor, mais justo, livre e próspero! Devemos enaltecer e viver nossas culturas de forma que sejamos protagonistas, numa sociedade invasiva e carente de: vida, justiça, alegria e força.

Sobre o Blog

O GV Cult – Núcleo de Criatividade e Cultura da FGV desenvolve atividades de criação, fruição, gerenciamento, produção e execução de projetos culturais e de exercícios em criatividade.