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GV CULT - Criatividade e Cultura

Aquilo Que Não Pode Ser Dito Devemos Atravessar em Silêncio

GVcult

18/12/2014 09h00

Por Vítor Steinberg.

Nenhuma alma é pura. Talvez das crianças, não lembro. Um filósofo (de séculos atrás) inventou a palavra "infância" denominando àqueles que "não sabem falar" – os "in" – "fonos". Assim mesmo, nome de doença. Como se atravessássemos lentos anos de formação numa enfermidade só curada pela adolescência. Daí é bom lembrar que "adolescente" vem de "adoecer".

Quando nos curamos destes dois ritos de passagem? O adoecer da infância e a doença da puberdade? Qual é o preciso momento? Quando pensamos estar livres, fomos corrompidos. Porque toda alma é corrompida. E corrupta. E corruptível. Isso deve ser maturidade. Reconhecer a fratura, a corrosão, a corrupção, o que quebrou em você.

Sarar, curar, melhorar. Um mundo "only love" 2014 mostrou que não dá. Se a gente talvez parasse para pensar… E afinal assumíssemos que a corrupção é invencível ao ser humano. Não seria covardia, desistência ou "pensar negativo". Porém reconhecer como as coisas se adulteram, quebram. A alma é cubista, alma é fragmento pulverizado. Não existe nenhuma alma perfeita.

Por que isso seria "pensar negativo"? Pensamento não tem disfunção erétil. As pessoas que brocham é por que estão nervosas. O sangue da ereção vem da cabeça. Não vem do coração. A ciência já provou. Até já filmou. Claro, não filmou ainda nenhum sonho de alguém (do jeito que queríamos ver), mas filmou o sangue que vem cabeça. O sangue da ereção. Como se muralhas da China cruzassem o caminho do sangue no momento que a pessoa fica preocupada. Ou mental. O que é mesmo sem graça é: ou ser muito sentimental ou demasiadamente mental. Ambas as coisas são contrabalançáveis, mas ainda sim são corruptas.

Não sei se jazo embriagado de amor líquido. Quiçá, este ano fiz até um filme sobre o tema. Fico em dúvida se cavalheirismo foi confundido com machismo. Se o sexo vai finalmente ser ruim. Se as mulheres são capetas treinadas para nos enlouquecer. As pesquisas recentes dizem que 98% das pessoas quem perdem aparelhos celulares (até mais de 5 vezes por ano) são as mulheres.

Nisso me vem o signo do rompimento da comunicação – ou o desprezo da simpatia, da telepatia – da troca, da transa, da conversa, da localização, da referência, do objeto, do filho que era para guardar na bolsa, da artificialidade desse filho, do não desejo desse filho. Um corte selvagem – de bacante – no cordão umbilical que conecta a existência do homem à grande mãe natureza. Por que nos transformamos em absolutos idiotas. Que natureza primeva de um ser – as mulheres – desejaria fabricar a energia que prosseguisse à imensa e visível legião de idiotas?

Pátria é mãe. Essa é a essência do nosso tempo hermafrodita. Nosso tempo travesti. Descobrirmos nossa identidade corrupta: não há machismo ou feminismo. Vai acontecer o transformismo. Dionisíaco. E nem um pouco teatral.

Os homens do ângulo das mulheres – que os amam, mas os detestam – e as mulheres do ângulo dos homens – que as detestam, mas as amam. As pessoas necessitarão viver amores impossíveis e esquecer os possíveis.

Dica de um filme para as férias: "Monika e o Desejo", de Ingmar Bergman.

Sobre o filme diz Godard: "É preciso ver Monika, nem que seja apenas pelos extraordinários minutos em que Harriet Andersson, antes de se deitar novamente com um sujeito que ela abandonara, mira fixamente a câmara, os olhos zombeteiros tomados de angústia, convertendo o espectador em testemunha do desprezo que ela tem por si mesma, por ter optado involuntariamente pelo inferno, e não pelo céu. É a tomada mais triste da história do cinema".

Edição: Samy Dana e Octavio Augusto de Barros.

Sobre o editor

Guilherme Mazzeo é coordenador institucional do GvCult, graduando em Administração Pública pela FGV-EAESP. Um paulista criado em Salvador, um ser humano que acredita na cultura e na arte como a direção e o sentido para tudo e para todos. A arte é a mais bela expressão de um ser humano, é a natureza viva das coisas, a melhor tradução de tudo. Só a cultura soluciona de maneira sabia e inteligente tudo, a cultura é a chave para um mundo melhor, mais justo, livre e próspero! Devemos enaltecer e viver nossas culturas de forma que sejamos protagonistas, numa sociedade invasiva e carente de: vida, justiça, alegria e força.

Sobre o Blog

O GV Cult – Núcleo de Criatividade e Cultura da FGV desenvolve atividades de criação, fruição, gerenciamento, produção e execução de projetos culturais e de exercícios em criatividade.